IPCA
0,83 Abr.2024
Topo

Extra vende leite e requeijão em geladeira sem porta; quais são os riscos?

Henrique Santiago

Do UOL, em São Paulo

29/01/2022 04h00Atualizada em 29/01/2022 12h28

Uma loja da rede Mercado Extra, localizada na zona leste de São Paulo, tem vendido produtos refrigerados em condições inadequadas há pelo menos dois meses.

A reportagem visitou o supermercado, em Ermelino Matarazzo, e constatou que itens como margarinas, requeijões e leites estão dispostos em refrigeradores com duas portas quebradas. Especialistas afirmam que a prática é errada, e o consumo desses alimentos pode causar doenças.

Fotos feitas nos dias 15, 25 e 28 de janeiro mostram que o supermercado repõe o estoque de laticínios frequentemente, mas sem substituir o equipamento.

O Extra disse ao UOL, por meio de nota, que o equipamento apresentado pela reportagem está passando por manutenção e que a medição de temperatura é feita "constantemente" e de "forma rigorosa". Diz ainda que as portas deveriam ser recolocadas ainda na sexta-feira, 28 (leia a íntegra no fim deste texto).

Clientes compram normalmente

Loja do Extra, em Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo, vende refrigerados em equipamento quebrado  - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Clientes compram alimentos refrigerados em condições inadequadas em 28 de janeiro de 2022
Imagem: Arquivo pessoal

Na tarde de quinta-feira (27), a aposentada Rosemeire Silva, 61, carregava uma cesta de compras com poucos itens, nenhum refrigerado. Ela não se surpreendeu com a ausência das portas. "Sempre foi aberto, acho que quebrou um vidro. Já comprei e nunca tive problemas, mas é aberto, sempre foi", afirma.

A reportagem ouviu de clientes do Mercado Extra que o equipamento está nessa situação há cerca de dois meses.

Após as 16h, a movimentação da loja era pouca, mas um ou outro consumidor andava até a gôndola refrigerada para analisar preços e pegar um item para pôr no carrinho.

A assistente de qualidade Cristina Navarro, 45, é frequentadora da loja e diz "nunca ter reparado" na irregularidade do equipamento que preserva a qualidade dos produtos.

"Eu acredito que seja um problema, tem que manter fechado, né? Sinto medo porque você paga por um produto caro que pode estar estragado", conta. "Posso até reclamar com o gerente."

"Qualidade comprometida"

Simone de Carvalho Balian, professora de medicina veterinária e zootecnia da USP (Universidade de São Paulo) e especialista em inspeção sanitária de produtos de origem animal, afirma que o modelo de refrigerador apresentado nas fotos requer portas encaixadas e vedadas com borracha, a fim de manter os alimentos isolados do ambiente externo.

Ela afirma que a simples presença de uma pessoa no corredor do supermercado já carrega um fluxo de ar suficiente para alterar a temperatura dos produtos. Ela também diz que há risco de pragas, como ratos e baratas, terem contato com os produtos, possibilitando o surgimento de doenças.

"Quanto mais tempo os produtos ficam expostos [sem o equipamento correto], maior é o risco de comprometer sua qualidade. O sabor será alterado por causa do aumento da carga microbiana."

Consumo pode causar doenças

Loja do Extra, em Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo, vende refrigerados em equipamento quebrado - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Extra vende alimentos como margarina e requeijão em refrigerador quebrado há pelo menos dois meses, segundo clientes. Foto de 15 de janeiro de 2022
Imagem: Arquivo pessoal

A professora de Nutrição da UFG (Universidade Federal de Goiás) Thaísa Anders Carvalho Souza conta que a mudança de gosto do alimento pode ser sentida, por exemplo, a partir de seis horas com uma refrigeração indevida.

"Mesmo que o supermercado faça um controle, é difícil imaginar que todos os alimentos estão dentro da temperatura adequada."

Os supermercados também têm refrigeradores sem portas, mas isso não significa que a prática seja incorreta, desde que a temperatura seja ideal, diz ela

Por se tratar de itens industrializados, Souza explica que a adição de aditivos como acidulantes e umectantes impede a multiplicação rápida de bactérias, mas não elimina a presença delas.

O leite pasteurizado, por exemplo, está mais próximo do seu estado original e mais suscetível a uma contaminação mais acelerada. Já a margarina e o requeijão passam por alterações de processamento, adiando a proliferação de micróbios, mas não bloqueando.

O consumo de um alimento contaminado pode causar doenças como gastroenterite, diz Souza. Os sintomas mais comuns são náusea, vômito e diarreia.

Pessoas com o sistema imunológico baixo, que tratam doenças como câncer e lúpus, têm probabilidade de ver o quadro clínico piorar, podendo até morrer.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo, por meio da SMS (Secretaria Municipal da Saúde) e da Covisa (Coordenaria de Vigilância em Saúde) informou que o supermercado Extra pode estar cometendo infração sanitária, "caso as temperaturas de armazenamento comprometam a segurança e qualidade dos alimentos armazenados, segundo os dispositivos da Portaria Municipal 2619/11."

O que diz o Extra

O supermercado diz que monitora a temperatura "constantemente e de forma rigorosa" enquanto o equipamento está em "manutenção". Leia a íntegra da nota enviada ao UOL na sexta-feira (28) :

"A rede informa que segue rigorosamente todos os procedimentos de segurança alimentar em suas lojas, tanto os que estão previstos nas diretrizes da companhia, quanto os que são exigidos pelos órgãos competentes. A rede esclarece que os equipamentos citados estão passando por manutenção, procedimento realizado constantemente e de forma rigorosa. Nesse período, a medição da temperatura é feita manualmente várias vezes ao dia para garantir que esteja dentro dos padrões exigidos. Os ajustes estão sendo realizados e as portas devem ser recolocadas ainda hoje [sexta-feira, 28]."

PUBLICIDADE
Errata: este conteúdo foi atualizado
O texto mencionava leite tipo C, mas essa nomenclatura não é mais usada. O certo é leite pasteurizado. A informação foi corrigida.